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Leituras de Maio de 2018

Maio foi um mês de muitas atividades, inclusive eventos que fui assistir ou participar. Fiquei meio que sem o tempo habitual de leitura, e acabei lendo poucos livros e mais histórias em quadrinhos.

 

Science Fiction, de Adam Roberts. Londres & Nova York: Routledge, The New Critical Idiom, 2003 [2000], 204 páginas. Trade paperback. Em maio, fui convidado pelo editor Adilson Silva Ramachandra, da Editora Jangada, para falar com Cláudia Fusco no lançamento de A Verdadeira História da Ficção Científica: Do Preconceito à Conquista das Massas, de Adam Roberts. Achei então este Science Fiction na pilha de livos que meu filho uso na sua pesquisa de mestrado, e que ele tinha deixado aqui em casa. Eu já havia consultado o livro para as minhas próprias pesquisas, mas era hora de terminar a leitura para me preparar para o bate papo. O livro saiu em uma série muito interessante, The New Critical Idiom, da qual eu já havia lido outros dois títulos, um sobre metaficção e outro sobre mito. Ela se dedica justamente a atualizar o ambiente universitário em língua inglesa, com introduções substanciais a diversos assuntos que vinham entrando nessa esfera, da década de 1980 em diante.

O enfoque de Roberts provavelmente surge da crítica pós-modernista e das questões de identidade que ela incorpora. Lembra especialmente Scott McCracken no seu Pulp: Reading Popular Fiction (1998), ótimo livro que tem a ficção científica como apenas um de seus assuntos — juntamente com a ficção de detetive e a de histórias de amor, e o horror gótico. Isso porque Roberts, a partir da discussão do teórico Darko Suvin do novum (os elementos na FC que parecem novos e dissonantes em relação ao entendimento convencionado da realidade) e do estranhamento cognitivo, reposiciona o encontro com a alteridade como aspecto central do gênero:

“Em outras palavras, a função simbólica-chave do novum da FC é precisamente a representação do encontro com a diferença, o Outro, a alteridade.” —Adam Roberts, Science Fiction (2000).

Novamente, algo semelhante está em McCracken, mas Roberts transforma a constatação em uma espécie de método crítico e de valoração, saudando alguns autores quando eles representam um encontro positivo com a alteridade, e condenando outros por sua deficiência em fazê-lo. Se por um lado, isso o leva a cometer alguns excessos interpretativos, por outro o coloca mais no centro, quinze ou dezoito anos depois, das ansiedades atuais em torno de celebração da diferença e da diversidade, e das qualidades subversivas que a FC pode desenvolver. É interessante ainda observar que neste livro Roberts não é muito simpático à ideia da proto ficção científica (ocorrências de precursores do gênero anteriores ao século 19), ou, na sua definição, pré-Romantismo:

“Eu considero a FC como sendo moderna, não antiga; e como ‘moderna’ eu quero dizer pós-romântica; o que é o mesmo que dizer que ela vem com a reavaliação da cultura e metafísica associada ao período romântico […]” —Adam Roberts, Science Fiction (2000).

O curioso aí é que a discussão da proto FC torna-se central justamente para a original hipótese seu novo livro, A Verdadeira História da Ficção Científica: a tese de que a reforma protestante teria sido essencial para o surgimento da mentalidade necessária à produção da ficção científica.

 

Ate de capa de Donato Giancola.

The Ordinary, de Jim Grimsley. Nova York: Tor Books, 1.ª edição, 2004, 368 páginas. Capa de Donato Giancola. Hardcover. Este é um romance de ficção científica e fantasia de um autor que já ganhou o Lambda Award, focado em assuntos LGBT. Traz uma linda capa do mestre da pintura a óleo Donato Giancola. O autor Jim Grimsley andou sendo publicado na Asimov’s Science Fiction e já foi comparado a Ursula K. Le Guin — comparação que, além da capa, me motivou a conferir este seu trabalho. Faz parte de um universo ficcional que Grimsley vem desenvolvendo, mas com aquela liberdade que caracterizou o universo Hainish de Le Guin.

The Ordinary segue, em sua maior parte, uma linguista chamada Jedda, que, parte de uma delegação diplomática/comercial de um mundo de alta tecnologia, vai a um outro, medievalesco e estranho por ser um mundo plano, Irion. O meio para a visita é um portal mágico que une os dois mundos. A delegação está lá sob falsos pretextos. Os falsos pretextos visam dar uma desculpa, tipo “Golfo de Tonquim” (que disparou a guerra do Vietnã), para a invasão do lugar. A sociedade tecnológica está em guerra, no espaço, com robôs, e precisa dos recursos que Irion possui. Mas o poder mágico desse mundo resulta em uma derrota avassaladora para eles, momento que é um dos melhores, do livro. Jedda fica para trás depois que a delegação é expulsa, e acaba sendo apresentada ao grande mago que controla Irion. Jedda é bissexual. Ela é atraída pelo mago, mas acaba gravitando na direção de uma mulher que irá herdar o poder mágico desse mundo. Até certo ponto, a heroína parece estar sendo treinada pelo homem para se aproximar da mulher, Malin. Salvo pelo tom sofisticado, interiorizado mas ao mesmo tempo descritivo da narrativa, o principal efeito do romance está na viagem no tempo que coloca uma no caminho da outra. E a mudança correspondente, do ponto de vista narrativo, que migra de Jedda para Malin. Aparentemente, Malin precisa de uma dimensão emocional mais profunda, para galvanizar os seus poderes mágicos e o seu caráter como dirigente. Falta ao livro, porém, uma pegada mais forte para a narrativa propriamente dita e mais situações de tensão envolvendo Jedda e Malin. Na ausência, acaba sendo menos do que memorável.

A exuberante arte de capa do ítalo-americano Donato Giancola é uma pintura a óleo de elementos sinuosos, sensuais, que expressam a fusão do orgânico como a super-ciência, própria  da mistura de FC e fantasia que o romance oferece. Giancola é um dos três ou quatro principais artistas de ficção científica da atualidade, com um sóbrio virtuosismo em todos os elementos da pintura clássica, com textura e luz renascentistas e detalhamento pré-rafaelita.

 

O Menino da Rosa, de Tony Monti. São Paulo: Editora Hedra, 2008, 48 páginas. Texto de orelha de Marcelino Freire. Brochura. Tony Monti é um colega de graduação em Letras na USP, e o ganhador do Projeto Nascente de Melhor Texto (realização da pró-Reitoria de Cultura da Universidade de São Paulo e do Grupo Abril de Comunicações) um ano depois que o meu O Par: Uma Novela Amazônica ganhou esse concurso. Tony se aproximou da Geração 90 em termos de estilo e abordagem literária, e participou da antologia de Nelson de Oliveira, Geração Zero Zero: Fricções em Rede (2011). De modo que é natural a presença de um dos grandes nomes da Geração 90, Marcelino Freire, assinando o texto da orelha. Li mais um livro dele, O Mentiroso, uma reunião de contos lançada pela 7 Letras, do Rio de Janeiro. Este O Menino da Rosa também é anunciado como livro de contos, mas imagino que o mais apropriado seria chamar seu conteúdo de crônicas.

O tema é a infância, desenvolvido em textos curtos de uma ou duas páginas cada. Como está implícito que se trata da infância do próprio autor, acho que é possível chamar o livro de “autoficção” — uma das tendências atuais do mainstream. Os textos são marcados pela delicadeza de situações de descoberta, perplexidade e confusão, encontros, desencontros e reencontros, com sutis toques de ironia. Nesse tipo de literatura, os efeitos precisam estar concentrados e aparecerem com precisão, que Tony parece alcançar com facilidade.

 

Arte de capa de Lais Dias.

O Ovo do Elefante, de Tiago de Melo Andrade. São Paulo: Melhoramentos, 2010, 128 páginas. Capa e ilustrações internas de Lais Dias. Brochura. Os assuntos afrofuturismo e cultura afro estão crescendo no ambiente da ficção científica e fantasia, mas esta novela de fantasia para crianças, que adquiri em um dos Fantasticons organizados por Silvio Alexandre, lembra a gente de que no Brasil a literatura infantil e juvenil já vinha trilhando essa estrada há algum tempo. Antes de Tiago de Melo Andrade, Simone Saueressig tem no seu O Palácio de Ifê (1989) um outro exemplo.

Em O Ovo do Elefante, a narrativa começa na África e termina no Brasil, ainda em tempos coloniais e portanto, durante a escravatura. Acompanha a menina Badu, uma princesa africana que vê a sua nação devastada pela cobiça despertada por um reino vizinho, quando se descobre que foi desenterrado lá um diamante do tamanho de um “ovo de elefante” (uma figura de linguagem: elefante não põe ovos, mas se pusesse você imagina o tamanho). Levada como escrava, ela encontra alguma simpatia da parte de uma senhora, que a trata bem. Mas os portugueses, que usavam esse reino como fornecedor de escravos, ficam sabendo da existência da pedra e atacam o lugar, capturando Badu uma segunda vez. Tá na cara que o diamante representa uma maldição. A heroína é embarcada em um navio negreiro e vai parar no Nordeste Brasileiro, escrava de uma senhora metida e cruel, casada com o dono de um engenho de açúcar. Lá, é castigada com frequência e chega a ser mutilada. Mas mesmo no Brasil, o diamante dá um jeito de entrar no caminho de Badu, trancado em um navio que acabou vindo encalhar em uma praia próxima, a tripulação comida por um casal de leões que também viajava nele, e que se soltou durante a jornada. Nessa altura da narrativa, a menina reencontra o guerreiro Kamau, que havia comandado o ataque ao povo dela. Por todo o trajeto até ali, Badu ouve a voz de seu pai, que lhe diz que ela precisa usar a riqueza que o diamante traria, para fundar um quilombo na região — com a ajuda de Kamau, mas tendo que enfrentar um implacável capitão do mato. As peripécias desta novela para crianças e jovens são interessantes, e ela parece ter uma pesquisa sólida sobre um assunto tão forte. É com respeito a isso que o livro faz o leitor pensar sobre o casamento entre assunto e narrativa, cujo tom quase-fofo soa leve demais para a gravidade da violência descrita em quase todo as suas páginas. Por outro lado, as ilustrações internas de Lais Dias são muito ricas e evocam com poesia a cultura afro, embora aconteça com ela o mesmo que se deu com a arte de capa de Marco Cena para o livro de Saueressig resenhado aqui mês passado: a arte da capa não tem a mesma força nem a clareza das ilustrações internas.

 

Quadrinhos

Arte de capa de Bong Dazo e Dan Parsons.

Comics Star Wars 15: Cavaleiros da Antiga República 3, de John Jackson Miller (texto), Bong Dazo e Scott Hepburn (arte). Embu das Artes-SP: Planeta DeAgostini do Brasil, 2015, 232 páginas. Arte de capa de Bong Dazo & Dan Parsons. Capa dura. Há alguns anos que estou acompanhando esta série de quadrinhos de Star Wars desenvolvida a partir de um videogame da franquia, Knights of the Old Republic (2003), ambientada cerca de quatro mil anos antes dos eventos da série vista no cinema. Este é o terceiro volume encadernado que leio. No segundo, que resenhei para o site do Who’s Geek, a aventura termina com o grupo de heróis encontrando a obra de Lorde Adasca, um empreendedor megalomaníaco que armou com hiperpropulsores aqueles vermes gigantes que Han Solo e Leia Organa descobrem em um asteroide, enquanto fogem das naves imperiais, em O Império Contra-Ataca (1980). Uma praga de armas biológicas de destruição em massa. Neste volume aqui, o sujeito está oferecendo a sua obra tanto para os militares já fascistoides da Velha República quanto para invasores mandalorianos.

Os heróis da série são o atrapalhado padawan-ronin Zayne Carrick e a bela Jarael, uma jovem muita capaz, com jeito de elfa. Uma confusão na estação espacial é a chance que precisam para azedarem os planos grotescos de Adasca. Mas no processo acontece o sacrifício do cientista Camper, de que Jarael cuidava zelosamente. Esse trecho do livro é dramático mas o desenho de Bong Dazo tem uma arte-final muito dura e cenas atulhadas, que acabam diluindo a sua força. Dazo está de volta na história seguinte, mas a arte-final de Dan Parsons e as cores de Michael Atiyeh deixam a arte muito mais leve e com um atraente ar europeu. Zayne reencontra o seu sidekick Gryph, um alienígena, nos subterrâneos do planeta Taris, ocupado pelos mandalorianos. Os dois se envolvem com ações da resistência local. Como Zayne é acusado injustamente por uma camarilha jedi de ter assassinado seus colegas padawans, ele é quase morto por uma amiga, irmã de um desses colegas. Enquanto isso, Jarael está às voltas com Alek, o mandaloriano que eles recolheram pelo caminho no volume anterior, e que vem, compreensivelmente, desenvolvendo uma queda pela garota. De volta a Taris, Zayne cumpre uma missão na torre de instalações na superfície, onde é atacado pela jedi Raana Tey, escapando por pouco. Na história seguinte, os desenhos são de Scott Repburn, mais soltos e estilizados, nem sempre adequados para o detalhamento que o universo de Star Wars pede. Nela, Lucien, o chefe dos jedi que caçam Zayne, é informado pela vidente cega Q’anilia de uma visão em que aparecem Darth Vader e Luke Skywalker. Eles discutem pela primeira vez sobre um talismã sith chamado Muur — que se encontra justamente em Taris. Lucien envia uma jovem jedi chamada Celeste Morne para recuperar Muur e acabar com Zayne de uma vez por todas. O que os jedi temem é a profecia de que um padawan iria abrir as portas para o lado negro da força na galáxia, e agora lá está Zayne Carrick, o último sobrevivente dos padawans, no mesmo planeta em que se encontra o amuleto sith… No processo, porém, o objeto cai nas mãos dos mandalorianos, e para recuperá-lo o herói e Celeste enfrentam perigos o suficiente para ela duvidar da justeza da sua missão assassina. Os volumes da coleção não são muito “redondos” em termos de arco narrativo, e claramente nessa história se inicia um novo arco, que fica em suspenso até o próximo livro. Gosto muito do trabalho de John Jackson Miller nesta série, mas há alguns problemas que incluem a separação do núcleo de heróis, com a sempre encantadora Jarael retornando só no final, e uma subtrama com uma praga de zumbis — algo que, na minha opinião, dificilmente funciona bem com ficção científica. E a ideia de um maligno amuleto sith, indutor de loucura e centrando buscas de heróis e vilões parece pinçado diretamente de O Senhor dos Anéis… O final é dramático e contundente, de qualquer modo, e o interesse pelo próximo volume se mantém.

 

Arte de capa de Brent Anderson & John Starr.

Rising Stars: Visitations, de J. Michael Straczynski (texto). Los Angeles: Top Cow Publications, 2002, 64 páginas. Capa de Brent Anderson & John Starr. Brochura. Straczynski é o criador da série televisiva de space opera Babylon 5, uma favorita de minha esposa, Finisia Fideli. Depois do fim da série, Straczynski passou um tempo atuando como roteirista de quadrinhos. Nessa área, conheci seu trabalho para a Marvel, com Thor, Homem-Aranha e Doutor Estranho. Fique muito bem impressionado. Tanto que, quando trombo com algum material escrito por ele, minha tendência é adquirir. Foi o que aconteceu com Rising Stars Vol. 2 — que eu deixei pendurado enquanto buscava, na mesma loja em que o adquiri, a Omniverse, o volume 1 ou algum outro produto da mesma série, mas anterior. Há pouco, encontrei na Omniverse este Visitations, que é justamente uma introdução à série.

A premissa não tem muito ineditismo: um meteoro explode nas proximidades de uma cidadezinha americana, e todas as crianças em gestação ou geradas pouco depois, 113 delas, passam a desenvolver superpoderes. São os “Pederson Specials”, a partir do nome da cidade. Ecos aí do clássico britânico de John Wyndham, Aldeia dos Malditos (The Midwich Cuckoos), com a diferença de que as crianças são internadas, todas juntas, em instalações federais. A partir disso a narrativa acompanha, de modo episódico, algumas situações: um palhaço contratado para entreter as crianças no dia do seu internamento, e que mui obviamente está se borrando de medo delas; um menino com o impulso de ajudar outros e que finge ser uma das crianças afetadas, pagando um preço terrível por sua fantasia. Um dos diferenciais é um cientista das instalações, que é pessoa boa e paternal — contrário do clichê do cientista frio ou sádico, a lá Mengele. Esse cientista está no centro da última parte do gibi, em que uma das crianças, agora adulta e transformada em super-herói, faz uma visita para pedir conselhos. Sob a forma de diálogos e flashbacks, o episódio conta do ressentimento entre esse herói e um outro — lembrando que eles todos cresceram juntos e têm muita bagagem. Impressiona como a narrativa se esquiva com sutileza das situações padrão das HQs de super-heróis, que, se são super-humanos, têm nesta HQ uma pungente e acessível exploração do sentimento humano. A marca de Straczynski.

 

Arte de capa de Marco Soldi.

J. Kendall: Aventuras de uma Criminóloga N.º 17, de Giancarlo Berardi & Maurizio Mantero (texto), e Gustavo Trigo, Marco Soldi & Enio (arte). São Paulo: Mythos Editora, 130 páginas. Capa de Marco Soldi. Brochura. Encontrei este número antigo da série da criminóloga Júlia Kendall em uma das minhas visitas à loja Omniverse, em São Paulo. Luis Mauro, o proprietário, descobriu a série há pouco tempo, e disse que Berardi deveria escrever para a televisão. De fato, o roteiro é o destaque da série. O desta aventura é particularmente intrincado e interessante. Começa com Júlia (desenha com os traços de Audrey Hepburn) e um dos seus associados no Departamento de Polícia perseguindo um serial-killer que mata quarentonas e tinha sido posto pra correr por uma policial disfarçada. Capturado ao final de uma dinâmica perseguição, ele informa Júlia e as autoridades que, dos seis crimes atribuídos a ele, um não seria de sua responsabilidade. Depois de trombar com a burocracia jurídica da promotoria criminal, ela vai investigar sozinha, auxiliada por um detetive de seguros que é um dos personagens recorrentes da série: Leo (com a cara do ator Nick Nolte). Isso é central para a ficção de crime hard boiled americana — a figura do investigador solitário que vai além da prática policial e sua obsessão com o carimbo de “caso encerrado”. A investigação leva Júlia e Leo a um clube de sexo S&M e, a seguir, a um artista fracassado, como principal suspeito do assassinato de sua esposa. Há uma combinação interessante aí entre o assunto risqué do submundo do sexo tipo De Olhos bem Fechados, e um argumento, bem rascunhado pela mente arguta e erudita de Giancarlo Berardi, em torno da sublimação sexual na arte. Tudo isso em um gibi! Esta série do criador do western Ken Parker é uma das melhores coisas que podemos encontrar nas bancas, em termos de quadrinhos.

—Roberto Causo

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Leituras de Março de 2018

Março foi um mês de leituras diversificadas, mas com destaque para o inquietante romance de ficção científica Kindred: Laços de Sangue, de Octavia E. Butler, e para a polêmica avaliação das deficiências morais da literatura brasileira, feita por Martim Vasques da Cunha no estudo A Poeira da Glória.

 

Arte de capa de Dennis Beauvais.

Aliens Book 1: Earth Hive, de Steve Perry. Nova York: Bantam Spectra, 1992, 280 páginas. Capa de Dennis Beauvais. Paperback. Conheço Steve Perry da coluna que ele tinha no fanzine de Orson Scott Card, Short Form, em 2015 li um livro de sua filha, S. (de Stephani) D. Perry, Aliens: Criminal Enterprise — também parte dos tie-ins originais inspirados nas situações surgidas com o filme Aliens (1984, de James Cameron). Pai e filha têm uma escrita dura e feroz, como o assunto exige. Este romance, em particular, é inspirado pelo filme, cujas situações ele cita: um cabo veterano dos Colonial Marines e uma garota institucionalizada são os únicos sobreviventes de um surto dos aliens. Quando os militares decidem organizar uma expedição de coleta de espécimes em um mundo infestado por eles, o cabo é convocado e, no caminho, resgata a jovem do hospício. Ao mesmo tempo, na Terra um laboratório militar já trabalha no estudo dos organismos xenomorfos, quando uma seita fanática de adoradores dos alienígenas resolve invadi-lo e espalhar a infecção pelo nosso planeta. Só pelo resuminho dá pra sentir que a narrativa salta de uma situação para outra, o que resulta, quase que obrigatoriamente, numa certa superficialidade. Nem por isso o livro deixa de passar a impressão de retratar uma humanidade que, por razões militares, comerciais ou religiosas, caminha célere na direção do apocalipse alien. Há aí aquele problema de escancarar de um modo um pouco frugal a falência daquilo que os primeiros filmes tinham como objetivo maior: impedir que essa forma de vida infecciosa alcançasse o planeta Terra. E como vieram muitos outros romances originais de Aliens depois — eu li dois em 2015, para entrar no clima de terra devastada e de um confinamento claustrofóbico que tentei realizar no inédito “Mestre das Marés”, o segundo romance da série As Lições do Matador —, fica a sensação de que Steve Perry teria se precipitado ao entregar as joias da coroa tão cedo aos alienígenas.

De onde vem o interesse pelo universo criado por Dan O’Bannon e Ridley Scott, com Alien: O Oitavo Passageiro (1979)? Em grande parte, em razão do adversário da humanidade ser uma forma de vida que age cegamente, sem intenções, malícia ou razões estratégicas ou geopolíticas. Nem sequer uma civilização ela possui. A outra coisa é uma representação da humanidade atirada na galáxia arrastando consigo seus vícios e azares. Com Aliens: O Resgate (1986), Cameron introduziu o tema da FC militar e sublinhou ainda mais o cinismo criminoso da Companhia. Daí o naturalismo duro e cínico que predomina na série e nos livros e histórias em quadrinhos, destacando esse universo ficcional da idealização e do lado plástico e juvenil que temos em Star Wars, Star Trek, Guardiões da Galáxia e outras franquias. Os personagens parecem estar sempre espremidos entre o darwinismo brutal dos aliens, e o darwinismo social, empresarial, de uma humanidade que deveria ter aprendido alguma coisa de cá (o presente) pra lá (o futuro interestelar). São pontos de uma atitude crítica que vale tanto hoje, quanto valia em fins da década de 1970 ou durante a década de 1980. Talvez até mais.

P.S.: No Facebook, o tradutor Carlos Angelo lembrou que este livro é novelização da minissérie de quadrinhos Aliens: Outbreak, escrita por Mark Verheiden com arte de Mark A. Nelson e Ron Randall.

 

Sonetos do Amor Obscuro e Divã do Tamarit (Sonetos del amor oscuro; Divan del Tamarit), de Federico García Lorca. São Paulo: Folha de S. Paulo, Coleção Folha Literatura Íbero-Americana vol. 2, 2012, 88 páginas. Capa dura. Tradução e apresentação de William Agel de Mello. Falta poesia na minha dieta literária. Para diminuir essa deficiência, peguei outro dia este livro do celebrado Federico García Lorca, que oferece uma leitura rápida e intrigante, num livro de capa dura gostoso de manipular. Também dramaturgo, Lorca foi o poeta número um da Espanha no século 20, a vítima mais famosa do regime da facção anti-republicana da Guerra Civil Espanhola. O volume em questão abriga alguns dos seus últimos poemas escritos, distribuídos em dois livrinhos juntados aqui sob uma mesma capa. Consta que o primeiro, Soneto del amor oscuro (1936) só foi publicado parcialmente, por ter um conteúdo homossexual explícito. É um livro bilíngue.

O que salta aos olhos é a riqueza de imagens poéticas, às vezes de um certo hermetismo, e a intrusão o tema da morte e da violência no soneto de amor, de saudação do objeto de amor e de desejo. Há uma ironia dissonante aí, frente a doçura do soneto, e que compõe o principal efeito dos poemas. O mesmo teor persiste em Divan del Tamarit (1936), variando apenas os formatos de versificação — que incluem o gazel, uma forma de poema lírico-amoroso; e a casida, uma forma herdada da poesia árabe. Dessa última, “Da Mulher Estendida” se tornou minha favorita.

 

A Poeira da Glória, de Martim Vasques da Cunha. Rio de Janeiro: Editora Record, 2015, 628 palavras. Brochura. Ser um observador da ficção científica e outras formas de ficção de gênero no Brasil, como eu me imagino, significa também prestar alguma atenção a como a literatura brasileira se enxerga, se desenvolve e sente o papel da ficção popular. São poucos, é claro, os livros que realizam uma sondagem mais profunda e crítica da nossa literatura — e mais raros ainda aqueles que se debruçam sobre a ficção popular. Das minhas leituras, dá para citar exemplos como A Aventura Literária: Ensaios sobre Ficção e Ficções, de José Paulo Paes; O Espírito da Prosa: Uma Autobiografia Literária, de Cristóvão Tezza; e Muitas Peles, Luiz Bras.

Um modo de abordar a questão maior de onde se posiciona a ficção de gênero nacional nas nossas letras, é identificar e reconhecer as insuficiências da literatura brasileira como um todo, e confrontá-las com as faltas da literatura popular conforme percebidas pela crítica mainstreamA Poeira da Glória é um ensaio sobre o caráter da literatura brasileira, do século 19 ao presente, castigando suas tendências ao esteticismo e à falta de firmeza moral e do foco na liberdade interior da pessoa. É escrito num tom meio autocongratulatório e agressivo, mas o livro ainda é válido pelo que afirma e expõe. Cunha insiste que carece à literatura brasileira o foco em um eu íntegro que se expressa por um “fundo insubornável do ser”, expressão que ele toma do filósofo espanhol José Ortega y Gasset, para indicar autor e personagem que rejeitam a postura do “quietismo político” e do “estetização da realidade”. Ele também condena aquela crença de que apenas a literatura salva o brasileiro da penúria existencial do país, mesmo enquanto ela se esquiva de encarar de frente a dura realidade da vida. No processo, acusa Machado de Assis de “dissimulado” e adepto do “quietismo político”; Lima Barreto de apegado ao “esteticismo”; e Mário e Oswald de Andrade de, a partir e obras omo Macunaíma (1928) e Serafim Ponte Grande (1933), terem colocado a literatura brasileira em um “beco sem saída”. O que não dá para negar, até por ser uma afirmativa feita antes, em linhas gerais, por gente como José Paulo Paes, é que as práticas modernistas instauram

“o divórcio entre o leitor e o escritor, a separação entre os intelectuais que deveriam produzir uma obra para aprimorar a nossa imaginação moral e o público comum que gostaria de entendê-la, justamente para compreender a si próprio.

“Esse divórcio de sensibilidades nasce em definitivo com o Modernismo, mas se tornaria uma espécie de método nos anos posteriores, até chegar ao ápice na obra de Guimarães Rosa. E acontece algo mais, algo que já não percebemos porque esta cisão está impregnada em nossa visão de mundo: no anseio de escrever numa ‘língua brasileira’, esquecemos que a literatura é antes de tudo uma forma de comunicação entre os nossos semelhantes — e trocamos os dilemas morais da condição humana, os que nos transformam em pessoas, por um lugar, por este ente abstrato, que nem sequer tem uma identidade nacional, chamado Brasil.” —Martim Vasques da Cunha, A Poeira da Glória.

Cunha isola alguns nomes que escapam da tendência que ele condena: Cecília Meireles, Nelson Rodrigues, Otto Lara Resende e outro punhado. Sua análise vem até momentos mais recentes, e aborda gente como Raduan Nassar, Daniel Galera e Bernardo Carvalho. Cunha é Mestre em Filosofia e seu enfoque parte desse campo do conhecimento, de modo que nem sempre a terminologia crítica bate com o que estou acostumado. A discussão se baseia na concepção platônica e aristotélica do Bom, o Verdadeiro e o Belo, trindade expressa na obra de arte. Por aí, a beleza deve conduzir às dimensões mais profundas do ser. Segundo Cunha, na literatura brasileira a ênfase estaria apenas no Belo, com o esteticismo levando ao desprezo pelo Bom e o Verdadeiro, e expressando aí a superficialidade da conjuntura cultural brasileira. Mas como entender a questão do “fundo insubornável do ser”? É o eu profundo do sujeito, que resiste aos julgamentos e às pressões do meio social. A leitura de Os Intelectuais e as Massas (1992) , de John Carey, me vacinou contra Ortega y Gasset, mas é possível chegar a uma aproximação via self-reliance — o apoiar-se em si mesmo de Ralph Waldo Emerson e outros Transcendentalistas da Nova Inglaterra. Mesmo porque a cultura popular está cheia de exemplos do homem self-reliant — em filmes de western como Da Terra Nascem os Homens (The Big Country; 1958), e em personagens como o detetive Philip Marlowe ou o astronauta Perry Rhodan. O conceito soa mais democrático do que Ortega y Gasset e os tons apocalípticos do seu pensamento modernista, e certamente vem me guiando nos meus próprios escritos. Daí minha simpatia pela coragem de Martim Vasques da Cunha em afirmar essa carência da literatura e da cultura intelectual brasileira, mesmo que eu não tenha tanta certeza quanto a sua extrapolação desse quadro para o contexto da militância intelectual de esquerda, simbolizada, para ele, pela figura do crítico Antonio Candido. É claro, nem de longe quero sugerir que Cunha encontraria na cultura popular uma alternativa possível para o quadro que ele expõe.

 

O Lobo do Espaço, de Fausto Cunha. Rio de Janeiro: Ciranda dos Livros, 1984, 80 páginas. Ilustrado. Brochura. A ficha catalográfica desta novela de ficção científica é de 1977, o que não deixa de compor uma advertência para os apressados escritores de hoje. Fausto Cunha é um dos três ou quatro grandes nomes da FC brasileira da Primeira Onda, junto com André Carneiro, Dinah Silveira de Queiroz e Rubens Teixeira Scavone. Ramiro Giroldo estudou a sua obra na tese de doutorado “Alteridade à Margem: Estudo de As Noites Marcianas, de Fausto Cunha” (2012). Ele andou morando nos Estados Unidos e se metendo com a NASA. Nesse sentido, tanto esta novela quanto a fabulosa noveleta “Última Stella” (1981) demonstram que ele poderia ter sido um dos mais significativos autores nacionais de FC hard, se tivesse sido mais produtivo nessa área. Um dos aspectos interessantes da sua abordagem, é que, como conhecedor do gênero, Cunha não abria mão das lições da New Wave.

Uma concessão que O Lobo do Espaço faz à literatura juvenil é embutir aquilo que é basicamente uma história de aventura espacial como uma narrativa que um avô (o Capitão Argo) faz ao seu netinho, contando como foi uma expedição em particular, nos bons e velhos tempos em que ele pertenceu a uma organização explorador anônima, como parte da tripulação internacional da nave O Cão Prateado. A aventura se passa fora da Via Láctea, na galáxia Messier 101, a 20 milhões de anos-luz da Terra. Em um planeta em particular, eles descobrem uma agressiva forma de vida que se pendura como móbiles na atmosfera. São seres luminescentes que manipulam a luz para, por exemplo, destruir o módulo de pouso do herói e seus companheiros. Depois de tentar um contato com uma máquina telepática que projeta conceitos, o Capitão Argo deduz que qualquer tentativa de comunicação teria de se basear menos em ideias e mais em imagens, em cores. Eles descobrem que as criaturas recuam diante da cor amarela, e mais tarde se escondem no fundo do mar, protegidos por uma camada de plâncton vermelho. A partir da manipulação das cores, uma operação de resgate é organizada. É esse truque em particular que parece dar o toque de New Wave à aventura pulp da novela. A arte de capa é creditada a Guilherme Camarinha Martins, “sobre uma concepção de Fausto Cunha”, e tem cara de ser uma colagem a partir de ilustrações apanhadas em revistas da época. O livro é ilustrado com desenhos não-creditados, de estilos diferentes, mostrando astronautas, sondas e satélites artificiais, que também parecem ser resultado de apropriações semelhantes.

 

Kindred: Laços de Sangue (Kindred), de Octavia E. Butler. São Paulo: Editora Morro Branco, 2017 [1979], 446 palavras. Capa dura. Tradução de Carolina Caires Coelho. Um dos principais lançamentos do ano passado no Brasil, certificado pelos jornais O Estado de S. Paulo e Quatro Cinco Um, que o incluíram nas suas listas dos melhores lançamentos literários de 2017. Essa distinção, somada ao fato de ser um romance original de 1979, também puxa a orelha daqueles fãs que eternamente reclamam das editoras por publicarem clássicos da FC ao invés das novidades. Assim como O Livro do Juízo Final, de Connie Willis, é uma história de viagem no tempo, violenta e dedicada a expressar o nosso despreparo em lidar com a dura realidade do passado. As diferenças estão no fato de que, no livro de Willis, a viagem no tempo é algo muito institucionalizado e científico, enquanto que em Butler ela é involuntária e sem explicação. A escritora já havia aparecido no Brasil com um par de histórias na Isaac Asimov Magazine, e a Editora Arte & Ciência do escritor de FC Henrique Flory já havia tentado publicar Kindred aqui, no começo do século. Meu exemplar foi comprado na feira do livro da USP, ano passado.

O romance é narrado por uma mulher afro-americana de 1976, Dana, que, por esse processo misterioso, é projetada no passado anterior à Guerra da Secessão. Isso acontece toda vez que um garoto branco chamado Rufus se encontra em perigo mortal. O livro abre com ela retornando acidentadamente em uma dessas viagens, para perder o braço em uma parede — como no conto do brasileiro Jeronymo Monteiro, “Um Braço na Quarta Dimensão” (1964). Antes disso acontecer, Dana salva Rufus seguidamente. Ela passa semanas e meses em uma época em que a cor de sua pele a tornava vulnerável ao arbítrio dos brancos, mas, quando ela mesma está em perigo, retorna ao seu presente para descobrir que pouco tempo havia se passado. Em algumas ocasiões,  viaja com o marido Kevin, um caucasiano. Os dois acabam separados, e quando se reencontram no passado, retornam a 1976 juntos. Mas Dana ainda tem missões a cumprir no perigoso século 19. Butler é sensível não apenas ao sofrimento da sua heroína, mas também à desorientação de Kevin, que tem dificuldade para se readaptar ao presente, depois de passar anos no passado. O centro do romance, porém, é a relação dela com Rufus, uma pessoa que, mesmo enquanto reconhece a importância de Dana em sua vida, está tão ciente do poder que a ordem escravagista lhe dá, que não hesita em usá-la para obter o que deseja: Alice, a outra antepassada da heroína. A protagonista que colabora, de maneiras diferentes, embora a contragosto, em situações sexuais envolvendo outras pessoas também está presente na série Xenogenesis de Butler (cujo primeiro livro, Dawn, saiu em Portugal como Madrugada). Espelha, certamente, a situação dos escravos submetidos a um contexto de casamentos arranjados pelos senhores. Por tudo isso, o romance, embora não narre cenas tão fortes e degradantes quanto aquelas de The Underground Rairoad, de Colson Whitehead, e nem se dedique a uma panorâmica do escravismo nos Estados Unidos, é emocionalmente escruciante, com uma tensão presente página a página, resultando em uma narrativa de força rara e até superior ao premiado livro de Whitehead.

Assim como o conto em tom de crônica da brasileira Zora Seljan, “O Carnaval do Ano 2170” (1978), Kindred nos lembra de que a única máquina do tempo disponível para a humanidade é o aparelho reprodutor feminino, que conecta passado, presente e futuro. Essa viagem temporal está sujeita a todas as vicissitudes da condição humana. Como eu mesmo me dei conta, ao escrever meu romance A Corrida do Rinoceronte (2006), sobre um afro-descendente brasileiro que vai trabalhar nos EUA, onde se depara com a política racial local, é duro nos darmos conta de que, para estarmos aqui, foi preciso que uma mulher fosse abusada em algum momento do passado histórico e familiar. Butler enfrenta essa dura realidade de frente, como a sua heroína. Mas ela também se lembra da lição dos contos de Richard Wright (1908-1960), de que a violência contra o opressor é o primeiro sinal de que não se está completamente subordinado. A melhor leitura que fiz neste ano, até o momento.

 

Jean Nouvel, de Marco Casamonti. São Paulo: Folha de S. Paulo, Coleção Folha Grandes Arquitetos Vol. 8, 2011, 80 páginas. Capa dura. Tradução de Marcos Maffei. Minhas leituras sobre arquitetura não pararam no mês passado. Com este perfil do arquiteto francês Jean Nouvel, elas caem por completo no futurismo/pós-modernismo, com uma conexão, apontada pelo autor Marco Casamonti, com a abordagem historicista de Le Corbusier, em que o arquiteto retorna constantemente às soluções do passado para encontrar inspiração para seus projetos. Esteticamente, é um dos mais ricos exemplos, com um pendor para o detalhe que filtra a luz e colore o ambiente interno e a fachada externa de tons, reflexos pontilhistas e texturas — como se vê pela sugestão mourisca dos painéis externos do Instituto do Mundo Árabe, em Paris (e na capa do livro). Os interiores da ampliação do Centro de Arte Reina Sofia também são um grande exemplo, assim como a cúpula da Torre Agbar, ambiente de ficção científica no topo de um arranha-céu bem feio por fora. As fotos do Museu do Quai Branly, em Paris, sugerem uma concepção desarticulada, mas as do Teatro Guthrie (EUA) e as do Auditório Danish Radio (Dinamarca) comunicam a aura de projetos inspirados, em que há uma dança de planos e de subtons que impressiona. As concepções artísticas de alguns projetos — como o do Centro de Espetáculos de Seul e o da Filarmônica de Paris — lembram o toque surrealista do artista de FC Paul Lehr, enquanto o do Louvre de Abu Dhabi parece um disco voador pousado sobre um espelho d’água. A seção “O Pensamento” é composta de excertos do seu “Manifesto Lousiana” (2005), que evoca a física do macro e do micro, e denuncia que

“a arquitetura está aniquilando os lugares, banalizando-os e violando-os.” —Jean Nouvel, “Manifesto Louisiana” (2005).

Ao mesmo tempo, Nouvel clama por uma arquitetura que transcenda ao revelar geografias, histórias, cores, paisagens e horizontes. Palmas.

—Roberto Causo

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