Page 92 - Universo GalAxis Anual 2019
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PERFIL




                        Na sua arte pessoal, Vargas às vezes busca o   Curiosamente, a arte de  pin–ups também tem
                     surrealismo, tendência que também pôde expressar   influência no seu trabalho, com figuras femininas
                     na capa do clássico de Arthur C. Clarke, A Cidade e   muito bem realizadas, em uma série de quadros
                     as Estrelas, e de maneira mais próxima na narrati-  em que mulheres se misturam a elementos essen-
                     va visual “Eu, Possessão”, sua recente criação para   ciais da natureza, reconhecendo a força e a beleza
                     a antologia original de Ademir Pascale, Possessão   femininas. A influência da arte de pin–ups é subli-
                     Alienígena, livro que ele também ilustrou com ex-  mada nas poses e na centralidade da figura, mas
                     celência. A colaboração com Pascale começou com   sem o aspecto insinuante e sexualizado das pin–ups
                     esse escritor e editor procurando–o para participar   clássicas. De qualquer modo, nesses e em outros
                     de um projeto de e–book. Vagner aceitou e produziu   projetos, Vagner escapa do aspecto exclusivamente
                     uma arte visando estimular os autores a escreve-  decorativo da arte.
                     rem para o que se tornaria a antologia Possessão   Ele sempre gostou da ficção científica pela força
                     Alienígena. Esse desenho em grafite foi a base da   da sua visualidade, considerando–a um gênero que
                     incrível arte digital que brilha na capa do livro, que   abre muitas possibilidades. É muito positivo traba-
                     tem book design de Marcelo Bighetti. Para além da   lhar com algo que ele aprecia. “Para mim, a ficção
                     capa, o projeto já previa que o livro teria ilustrações   científica trouxe, principalmente, inspiração”, afir-
                     internas criadas por Vagner.              ma. “Acho que tem sido uma troca interessante, pois
                        Logo no começo, o artista planejou ilustrar as   também devolvi essa inspiração como arte de fic-
                     histórias da antologia, mas também participar ele   ção científica. Quero fazer algo a mais agora, com
                     mesmo com uma narrativa visual, que chamou de   um interesse que vai além da ilustração: os jogos.”
                     “Eu, Possessão”. Sua proposta tanto para a ilustra-  Um artista completo e versátil, Vagner é tão bom
                     ção do livro quanto para a sua narrativa era de ter   com a figura humana quanto com naves e paisagens
                     imagens mais numerosas e, no caso de “Eu, Pos-  espaciais ou ambientes high–tech. Funde habilmen-
                     sessão”, com colorido. Mais tarde, limitações edito-  te os elementos 3D que constrói, dentro da quali-
                     riais reduziram esse escopo. A certa altura, Vagner,   dade artística das suas ilustrações. O seu interesse
                     que já era colaborador da Devir Brasil, achou inte-  pela beleza feminina aparece na sua arte pessoal,
                     ressante apresentar a antologia a Douglas Quinta   naquela série em que as mulheres se identificam
                     Reis (1954–2017), um dos sócios fundadores da   com a aura mais sublime da natureza. Mas também
                     empresa. Ademir Pascale foi bastante aberto quan-  nas capas dos livros de FC que ilustrou, como os de
                     to a essa guinada no projeto.             Jorge Luiz Calife, considerado o “Pai da Ficção Cien-
                        “Como muitas coisas na ficção científica, você   tífica Hard Brasileira” e criador da heroína espacial
                     tem mensagens por baixo da fantasia, com certas   Angela Duncan. Em 2015, Vagner assinou a ilustra-
                     colocações relacionadas à psicologia humana e à   ção de capa na revista francesa de ficção científica
                     filosofia”, Vagner observa, “e acho que Possessão   Galaxies, que também trouxe um perfil dele — fato
                     Alienígena teve muito disso nos contos, e tentei co-  raríssimo para um artista brasileiro de FC.
                     locar algo assim nas ilustrações”. “Eu, Possessão”   De onde vem a sua versatilidade? “Primeiro,
                     representa a sua tendência de empregar os recur-  não se trata tanto da facilidade de fazer as coisas”,
                     sos da pintura para transmitir as mensagens que   responde. “Nunca achei que tivesse muita facilida-
                     deseja passar, muitas vezes comentando certas   de para pintar ou desenhar. É mais a vontade. Em
                     características humanas e os seus próprios sen-  alguns casos, talvez eu não fosse a pessoa mais
                     timentos. “Nessa série de imagens, a ideia foi mos-  indicada para fazer um trabalho, mas buscava as
                     trar que muitas vezes a pessoa está em guerra com   soluções para fazer. A questão é se esforçar para
                     alguma coisa que existe nela, às vezes o próprio   alcançar o resultado desejado.” A versatilidade vem
                     comportamento ou algo que ela cria e acaba en-  de gostar de muitas coisas, e de aceitar os desafios.
                     trando em conflito consigo mesma.” Inquietante e   A experiência com projetos publicados pela Edi-
                     violenta, a narrativa visual de “Eu, Possessão” tem   tora Pensamento com a autora Celina Fioravanti,
                     muita ironia e algo da estética surrealista.  e fazendo capas para a Ground e outras editoras



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