Page 79 - Universo GalAxis Anual 2019
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da pobreza, da desigualdade social e de renda, da   prensa, o retorno do soldado física ou mentalmente
                 opressão e dos seus mecanismos violentos. Segun-  lesado ao seio da sociedade para se transformar, di-
                 do o filósofo francês Grégoire Chamayou, em Teoria   reta ou indiretamente, num propagandista antiguerra.
                 do Drone (2013), o uso dos veículos aéreos não tri-  Existe aí uma distância entre os combatentes de
                 pulados em ataques aéreos e assassinatos tem o   que Chamayou não trata, mas que está implícita na
                 efeito semelhante de naturalizar a violência sobre   oposição “soldados cidadãos” — aqueles que deixam
                 pessoas a quem se nega qualquer condição além de   a sociedade para combater e retornam a ela sem
                 “simples alvo”. O mandato de proteger “vidas ame-  necessariamente terem alterado seus valores ou
                 ricanas” se estende a “combatentes” que se abstêm   pontos de vista — e tropas de forças especiais que
                 de comparecer ao campo de batalha, desse modo   operam num ethos de excepcionalismo e de segre-
                 roubando do inimigo a chance de provar–se mais   do que abafa tais riscos políticos. O soldado cidadão
                 forte ou capaz. Esse inimigo é prontamente visto   pode dizer “não”, recusar–se a matar fora das re-
                 como menos que humano, derrotado no processo   gras de engajamento ou da Convenção de Genebra,
                 natural de afirmação pela competição e pelo con-  e retornar à sociedade para lamentar ou denunciar
                 flito, de superioridade de uns sobre os outros: “O   atrocidades. Os membros das forças especiais po-
                 que poderia ainda se apresentar como um comba-  dem fazer o mesmo, mas a ocorrência é bem mais
                 te converte–se em simples campanha de abate”,     rara. Tanto que o jornalista Jeremy Scahill os coloca
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                 escreve Chamayou, sobre aquilo que alguém cha-  no centro da sua investigação das guerras sujas dos
                 mou de “caça ao homem preventiva". 31    Estados Unidos neste século, como parte de um apa-
                   A  teoria  de Chamayou  aborda  a  questão  dos   rato secreto de assassinato.
                 drones a partir da guerra aérea surgida nos século   “As características da guerra à distância po-
                 XX, que institui uma verticalização do poder militar   deriam servir para calar as críticas antiguerra que
                 e uma projeção de intenções de agressão estra-  tentam deter seu desenvolvimento”, afirmou em 1973
                 tégica pouco mediada pela presença de soldados   um artigo anônimo na revista Science for the People,
                 no terreno. O bombardeio aéreo não apenas ataca   citado em Teoria do Drone. “Os brinquedos não têm
                 o inimigo em terra, como destrói infraestrutura e   mães, nem esposas para protestarem contra suas
                 capacidade industrial. Quando dirigido a populações   perdas. A guerra à distância é muito barata. [...] A
                 civis, busca abalar o moral da sociedade que sus-  única coisa que resta a protestar é o assassinato e
                 tenta o esforço de guerra. A verticalização que faz   a subjugação dessas pessoas que o exército norte–
                 com que a tripulação do bombardeiro não veja de   americano chama de ‘comunistas’, gooks [termo ra-
                 perto o resultado dos seus atos se espelha em uma   cista para os asiáticos] ou simplesmente ‘o inimigo’.
                 distância horizontal em que não é preciso mobilizar   Mas sem dúvida, para o exército norte–americano,
                 uma enormidade de tropas e recursos para invadir   em princípio o mundo inteiro é inimigo potencial.” 32
                 e ocupar um território inimigo, e causar os efeitos   O artigo se refere a aviões bombardeiros e a
                 estratégicos desejados. Com o drone, o piloto pode   baterias de mísseis, mas antecipa a lógica por trás
                 se encontrar no seu próprio território nacional, en-  da adoção dos drones de ataque, cujo uso é racio-
                 quanto o aparelho ataca o território de outro país. O   nalizado em termos de uma projeção de poder sem
                 piloto combate sem ser mobilizado, deixa seu turno   projeção de vulnerabilidade.  Mas a projeção não
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                 de trabalho em tempo para pôr os filhos na cama ou   constitui uma estratégia antiterrorista ou contra–in-
                 ir à igreja ou às compras com a família. A violência   surgente em si mesma, de modo que os resultados
                 está costurada em seu cotidiano.         são frequentemente opostos aos desejados. Citando
                   De modo semelhante, os políticos e militares que   David Kilcullen & Andrew McDonald Exum em coluna
                 fazem uso dos serviços do piloto de drone esquivam–  no New York Times, Chamayou aventa que os ataques
                 se das questões políticas que marcaram a democra-  de drones “não fazem mais do que jogar a popula-
                 cia moderna americana desde a guerra do Vietnã: a   ção civil nos braços de grupos extremistas que lhes
                 rejeição popular do alistamento compulsório, a vul-  parecem, em suma, ‘menos odiosos que um inimigo
                 nerabilidade política trazida pela cobertura da im-  sem rosto que trava guerra a distância e em geral



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